Timóteo Pinto

Todos Somos Timóteo Pinto

Saturday, May 16, 2009

A salvação da produção musical vem da selva

Parece que a Amazônia não detém só o potencial de salvar o ecosistema planetário, mas tambem o de salvar a produção musical da falência decretada pelo mp3. Saiu na web recentemente um livro em pdf organizado por Ronaldo Lemos e Oana Castro, dentre outros, chamado "Tecnobrega: O Pará Reinventando o Negócio da Música", que traz a tábua de salvação para os artistas que estão vendo suas carreiras irem para o ralo com a falência da industria fonográfica.

Que esta indústria está falida, ninguém com suas faculdades mentais intactas é capaz de questionar. Os números comprovam, sob qualquer ponto de vista que se analise a questão. Victor & Leo, o maior fenômeno pop da atualidade, não consegue nem de longe chegar na marca de um milhão de discos vendidos. O próprio rei Roberto Carlos, que sempre foi aposta ganha de antemão, não consegue mais atingir a marca.

O que a cena brega de Belém inventou não foi feito com intensões políticas nem ideológicas, mas sim como alternativa de sobrevivência cultural e financeira por parte dos envolvidos. De uma maneira simplificada, podemos dizer que negócio do tecnobrega funciona de acordo com o seguinte ciclo de realimentação, composto por sete etapas:

1) Os artistas gravam seus discos em estúdio - próprio ou de terceiros.
2) As melhores produções são levadas a reprodutores de larga escala ou camelôs.
3) Camelôs vendem os discos a preços compatíveis com a realidade local e os divulgam.
4) DJs tocam esses discos nas festas.
5) Os artistas são contratados para shows.
6) Nos shows, CDs e DVDs são gravados e vendidos.
7) Músicas e bandas fazem sucesso e realimentam o processo.

Esse modelo é extremamente funcional, tanto para os artistas quanto para o público, gerando fonte de renda para muita gente. Um estudo da FGV prova isso com números: cada ambulante vende em média 300 CDs e 200 DVDs por mês. A maior parte das vendas vem dos grandes reprodutores (cerca de 80%). No entanto, 17% das vendas vêm da reprodução própria - o que, baseado no volume total de discos vendidos em Belém e na região metropolitana, é um montante considerável na análise da geração de renda.

No caso específico da cena tecnobrega, pesa também a questão das festas de aparelhagem. Elas reúnem milhares de baladeiros que veneram as aparelhagens como se fossem astros. As gigantestescas paredes de caixas de som produzem um tsunami sonoro que literalmente faz o chão tremer. A cabine dos DJs, chamadas de Altar Sonoro, têm nomes sugestivos como Nave do Som ou Duplo Cyber Comando e são equipadas com a mais alta tecnologia de produção de efeitos sonoros e visuais. Todos a observam como se fossse uma banda tocando no palco.

As aparelhagens mais famosas hoje são a Tupinambá, Rubi, Ciclone e Super Pop. Como as festas costumam durar um fim de semana inteiro, como raves, acabam gerando procura por artistas tecnobregas e favorecem o surgimentos de novos grupos, fazendo com que a cena tenha um crescimento contínuo e, dessa forma, contribuindo de forma decisiva para o novo modelo de produção musical nascido na Amazônia.



Em termos de êxito comercial, a Banda Calypso é o expoente máximo dessa metodologia de trabalho no que podemos chamar de Método Chimbinha de Gerenciamento de Carreiras. A dupla Joelma e Chimbinha inventou uma nova maneira de se virar sem depender de gravadoras comerciais. Eles criaram seu próprio selo e começaram a vender seus discos a preços mais acessíveis - entre R$ 5 e R$10 - em supermercados populares, feiras, festas e locais frequentados por fãs potenciais. A estratégia deu certo e o resultado todos já constataram.

Quando falei que a Banda Calypso era a banda brasileira da década a primeira coluna aqui no BiS, muita gente me chamou de louco suicida, esquecendo-se de que além de serem os grandes divulgadores desse modelo que pode salvar a produção de música no país, Joelma e Chimbinha são os maiores vendedores de discos do Brasil. Outra opinião minha que costuma arrancar gargalhadas de quem é adepto do senso comum é que Victor & Leo deveriam dar um pé na bunda da Sony Music. Além de não precisarem da multinacional, serviriam de exemplo para disseminar essa revolução na produção musical também no sul do país.

Como conclui Hermano Viana no texto da orelha do livro: "Quem quiser pensar o futuro da música não pode ignorar as lições tecnobregas da Amazônia digital."

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Wednesday, May 13, 2009

O funk, minha gente, é o futuro do movimento social

Por Ari Almeida & Marcelo Träsel

o bonde do tigrão vai anarquizar o bananão

Eu acho funk carioca o máximo.

Um bando de analfabetos funcionais miseráveis e sem o menor refinamento se junta, aprende a operar aparelhos até certo ponto sofisticados, apropria-se de peças da indústria cultural e avacalha com tudo, transformando-as em um batidão irresistível pontuado por letras que falam de suas próprias vidas. Cultura popular é isso aí.

Mais do que isso, estes jovens criam um mercado próprio para sua música, inventam festas que reforçam os laços comunitários — muito embora isso em geral envolva tomar posição contra outras comunidades — e criam um sistema de distribuição de renda e ascensão social próprio das favelas.

De acordo com reportagem da revista Carta Capital de 20 de abril, por Pedro Alexandre Sanches, não são raros os funkeiros que faturam mais de R$ 10 mil por mês. Além disso, sua música tem um sistema de distribuição independente de fato, passando longe das grandes gravadoras e até mesmo dos impostos cobrados pelo governo.

Os intelectuais de plantão, quando poderiam enxergar no funk a manifestação de uma imensa criatividade que, bem canalizada, poderia gerar música popular de excelente qualidade, preferem desqualificar o estilo com base em padrões eruditos. É óbvio que o funk é ruim. Difícil é esperar de excluídos semi-analfabetos que façam música que siga alto padrão, com a qual nunca tiveram contato.

Critica-se também a "mensagem" do funk. Mas ora, não se passou décadas exigindo uma cultura verdadeiramente popular no Brasil? Pois aí está ela. As letras falam da vida daquelas pessoas: assassinato e tráfico no horário comercial, sexo e drogas à noite para relaxar. Talvez algumas personalidades mais delicadas sintam nojo ao ver a falta de perspectivas daquela juventude exposta assim, nuazinha.

Assim como se chocam ao escutar meninas pedindo para serem "atoladas no cuzinho" ou coisa que o valha. Acham que isso mostra a exploração sofrida pela mulher nas rudes vielas onde mora a escória. Estranho não passar pela cabeça da gente de bem que elas possam realmente gostar disso e, na verdade, estejam levando o feminismo a um ponto mais alto, mostrando que podem encarar o sexo de maneira tanto quanto ou ainda mais fisiológica do que os homens.

O principal, no entanto, é que eles parecem estar se divertindo. E muito. No fundo, toda a grita contra o funk pode ser preconceito contra o fato de pobres estarem se divertindo. Da direita — porque, audácia! A ralé não tem o direito de se divertir! — ou da esquerda — porque eles deviam estar sofrendo com suas condições de vida subumanas e preparando a revolução, ou ao menos rendendo material para o Sebastião Salgado.

Acho o funk carioca o máximo não tanto como estilo musical — embora admita curtir um pancadão bem pegado em certos momentos —; acho o máximo mais como instituição. O funk, minha gente, é o futuro do movimento social.

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Wednesday, May 06, 2009

Pirataria legal

Gustavo CDs. Henrique CDs. Rodolfo CDs. Quem escuta os discos ao vivo das bandas do nordeste está habituado a ouvir esses nomes. Trata-se do sujeito que grava o show e que no dia seguinte colocará à venda o CD com a apresentação, de modo que o fã possa continuar se emocionando no conforto de seu lar.

Essa tradição é antiga. Ainda nos anos 90, Chiquinho da Discofran de Viçosa (CE) fazia suas gravações e as lançava em vinil. Com a chegada do CD e o consequente barateamento da gravação e reprodução, a moda pegou. Hoje em dia, praticamente todos os shows são gravados, no que pode ser classificado como institucionalização da pirataria, apesar de muitos não se considerarem pirateiros, mas divulgadores. Tanto que não é preciso pagar nada para a banda, basta um OK do dono da casa de shows e dos artistas.

Enquanto um Biquini Cavadão leva uma carreira inteira para lançar um disco ao vivo repleto de equívocos, os Aviões do Forró têm mais de duzentos "ao vivos" para download em sua comunidade no Orkut, todos relevantes, pois raramente o grupo repete músicas em seus shows. E a qualidade das gravações é surpreendente. Segundo Rodolfo Cezar, de Fortaleza, ela não depende apenas de quem grava. "Digo isso por experiência própria. O som da festa influi muito." Mas na grande maioria dos casos, a relação custo-benefício é satisfatória.



Como esse mercado está em plena ascensão, foi criada a Associação dos Gravadores, que exige um mínimo de dois anos de experiência e comprovação da qualidade das gravações. Gustavo Parente, de Salgueiro, Pernambuco, explica a importância da criação desse orgão. "O esquema foi criado a partir de uma discussão na comunidade 'Rede Forrozão N.1'. Com o gigantesco aumento das pessoas que se dizem gravadoras, os 'fulanos cds' que trabalham com profissionalismo se sentiram prejudicados por essa máfia nascida no Orkut. Sem um pingo de noção de áudio, esses caras se humilham só para ganharem alguns alôs durante o show e se acharem 'os estourados'." De acordo com a Associação, se o gravador for cadastrado, a qualidade é garantida.

Com a chegada do Orkut e a consolidação das redes sociais no Brasil, a distribuição das gravações deu um salto enorme. Os gravadores têm suas próprias comunidades, onde são tratados como autênticas celebridades, com direito a fãs e admiradores. A maioria dos gravadores da nova geração começou a trabalhar com isso em busca de fama, para ouvirem seus nomes nos shows e conquistar o prestígio dos amigos, para depois se profissionalizarem.

Convém frisar que esse hábito ainda está circunscrito ao norte do país. Quando artistas do sul vão se apresentar lá, não costumam permitir as gravações, com o velha e batido argumento da quebra de direitos autorais. Além de não evitar a pirataria, essa atitude burra impede os fãs de desfrutarem de performances únicas, que costumam ser feitas em momentos de especial inspiração.

Além da vantagem óbvia de usar a pirataria como divulgação, as bandas saem ganhando também na questão do teste de repertório. Todo artista sabe que no primeiro disco a escolha das músicas costuma ser mais fácil, porque a banda vem de um intenso período de shows e já sabe de antemão as músicas preferidas do público. A chamada "síndrome do segundo disco", que muitas bandas de rock enfrentam, deriva dessa deficiência do teste ao vivo.

Ao disponibilizarem seus shows em CDs que são vendidos logo após a apresentação, o teste do repertório ao vivo continua vai além do show. E ainda há o efeito multiplicador de que, além da pessoa que adquiriu a cópia, outras pessoas ouvirão as músicas e banda ganha um feedback perfeito. Tão perfeito que ao entrar no estúdio para gravar o próximo disco oficial, já sabe qual o setlist preferido pelos fãs.

No final todo mundo sai ganhando. Artista, vendedor de CD e público. É o tipo da coisa que dá certo quando se tem uma atitude pragmática e respeito mútuo entre produtor e consumidor, pois no final das contas, são pessoas lidando com pessoas. É como Victor, da dupla Victor & Leo, afirmou em entrevista recente: "Não enxergamos fãs, enxergamos pessoas e cada pessoa tem sua história de vida, suas vitórias, seus traumas, suas virtudes. Quando estamos diante de uma multidão, sabemos que cada pessoa ali pagou um ingresso para nos assistir, se deslocou de casa ou do trabalho e veio em busca de emoção. Não há uma multidão, mas milhares de 'cada um'".

PS do Timpin.: Deixo aqui meus efusivos agradecimentos a Flaviane Torres do blog do muido, cuja ajuda foi fundamental para a elaboração desse texto.

Comunidade do Gustavo CDs

Comunidade do Rodolfo CDs

Podem baixar à vontade, que é tudo legal.


originalmente publicado no site Bis



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Saturday, May 02, 2009

Tem socialite no funk

por Melina Dalboni

A mais nova funkeira do Rio não vem dos morros. Cunhada de João Gilberto e filha do conhecido dentista Olympio Faissol, a cantora Heloísa Faissol anda fazendo sucesso no Youtube com a música "Dou pra cachorro". Aos 38 anos, depois de ter sido estilista, acrobata, atriz, pintora e bailarina, a socialite resolveu cantar funk safadinho, chocando a família e o high society.

- Estou sem falar com minha família desde o ano passado. Tenho um irmão diplomata que está achando que eu estou doente - conta, às gargalhadas.

Heloísa vem sendo chamada de a nova Narcisa Tamborindeguy, de quem ela até admira a "autenticidade", mas acha que falta pé no chão. O outro apelido é Heloísa Quebra-Mansão.

Mas, por que agora a música? Por causa do Chico Buarque, ela exclama. Na tentativa de conquistá-lo, Heloísa escreveu textos, cartas, poemas, músicas e pintou quadros. Sua última cartada foi arriscar um rap: "Miau, miau, miau, pode até fazer au-au, pois só vou me sossegar quando eu te conquistar".

- Quando conheci o Chico, eu o admirei muito. Além de ser um grande artista, ele é ótimo pai, respeita a ex-mulher, é encantador, ético, ajuda outros artistas, ajuda os pobres, daí fiquei meio obcecada por ele. Tive até que fazer terapia porque minha vida parou - conta.

Admiradora de Preta Gil, Rita Lee e Carla Bruni, a funkeira que só tem "Dou pra cachorro" atualmente no repertório, atrai críticas. O DJ Marlboro disse que entende "quando os meninos da comunidade lançam músicas pornográficas, apesar de não concordar", mas uma patricinha ele não aceita porque "é muita queimação de filme para o funk". Por outro lado, Heloísa recebe o apoio de Tati Quebra-Barraco, com quem pensa em gravar.

- Por causa dessa música, ficam falando que eu sou burra. Mas deixa pra lá, um dia eu vou mostrar minhas outras letras, que falam de política, amor, crise, drogas - diz, enquanto fuma um... Marlboro.

Ela gostaria de gravar um CD e se apresentar no Via Show:
- Com a música, eu me encontrei. Não tenho dinheiro para fazer um CD agora, mas não vou desistir, mesmo sem o apoio da família.

Seu filho, João Artur, de 12 anos, entende o trabalho, ela diz.

Desde que começou a cantar seu primeiro e por enquanto único funk (Versão original: "Tô fervendo, tô no ponto, eu dou no primeiro encontro/ Se você for tarado, vem que eu gosto do babado"), as relações com a família estremeceram:
- Minha mãe mandou um recado de que me perdoou. Mas, de quê? Eu não matei, não roubei, não traí, não menti, mas eles não compreendem meu trabalho. Meu pai é um que vem com um discurso moralista.

João Gilberto, pai de sua afilhada Luisa Carolina - filha de sua irmã, Cláudia Faissol - também parece não aprovar.

- Soube que ele disse "A Lolozinha está muito doente. Precisa ser tratada". Ficou horrorizado - conta - Mas o João é um amor.

A carioca, que agora frequenta o Morro da Babilônia, no Leme, quer distância das "festas chatas" e dos "papos fúteis".
- O high society é falso. As pessoas mais simples falam na lata: "O cara transava mal pra caramba, parecia uma britadeira". As socialites dizem, com um sorrisinho: "Ai, ele é um amor". Às vezes, nem transam, nem gozam, mas têm que representar aquele personagem lady.

Depois de ser chamada de "Helouca" pelos antigos amigos, ela decidiu só andar com artistas e a turma da comunidade.

Formada pela Escola Suíço-Brasileira, em Santa Teresa, Heloísa estudou com Letícia e Tonico Monteiro de Carvalho, Marisa e Maria Rita Magalhães Pinto e Jaqueline De Botton. Aos 17 anos, foi morar em Paris, onde se formou em moda pela Esmod. Quando voltou ao Rio, resolveu abrir um ateliê, que durou pouco mais de um ano. Então estudou marketing, acrobacia, circo, pintura e namorou Duda Lacerda Soares, Andy Lundgren, João Pellegrino e o editor Charles Cosac.

Hoje, apesar de cantar para quem quiser ouvir que dá pra cachorro, conta que "está na seca".
- Eu adoraria estar dando pra cachorro porque quem dá pra cachorro deve estar feliz. Mas eu sou muito romântica. Escrevi essa letra inspirada numa amiga que estava dando mole para todos os homens num bar, e no Nietzsche, meu cachorro, que ficava trepando na perna de todo mundo que ia lá em casa.

A música que toca nas rádios é uma versão mais light da que roda na internet. Os DJs acharam o funk pesado demais e pediram uma letra mais leve.
- A maioria das pessoas para quem eu mostro a música cai na gargalhada. É quase uma coisa infantil, é lúdica, debochada.

Heloísa tem na gaveta o "Funk da galinha": "Cócórócócó, vem, me roça o fiofó/ Cócórócócó, te dou mole, dou sem dó".

Resta saber se as rádios vão pedir uma versão mais leve...

fonte: O Globo

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Friday, April 17, 2009

Pirate Bay torna-se mais popular depois de condenação

O feitiço voltou-se contra o feiticeiro 2

Como aconteceu na Itália, a censura à troca de arquivos só faz aumentar a fama do Pirate Bay

“For now, the attention brought by the highly-publicized trial has only made The Pirate Bay more popular. The site has swelled to some 22 million users. And thousands of Pirate Bay fans have flocked to sign up for its new $6 anonymization VPN service, which allows torrent feeders and seeders to conduct their business in private without leaving a trace of their internet IP addresses.

And since the trial began, membership in Sweden’s copyright reform Pirate Party has grown 50 percent, while its youth affiliate is now the second largest in Sweden.”
Wired

Thursday, April 09, 2009

Tudo junto & misturado

Latino, como sempre, é o dono das melhores sacadas. Em seu novo disco, chamou vários amigos para fazer duetos. O resultado foi uma salada de ritmos capaz de fazer os puristas vomitarem as próprias tripas por quatro dias consecutivos. Latino sacou o espírito da época e graças às parcerias, misturou diversos estilos, com diversos graus de êxito.

Mas não é do disco dele que quero falar aqui. Não agora. Agora é a hora de falar de uma revolução nem um pouco silenciosa que está ocorrendo na música brasileira. Não é a MPB, esta se encontra em estado catatônico e nada de empolgante pode se esperar dela. São os ritmos populares, aqueles que são tratados como lixo pela Zelite Cultural.

A globalização fez bem para os ritmos populares. Ao invés de comprarem briga com os pirateiros, usaram a contravenção para divulgar o seu som. Se ligaram que dinheiro se ganha é fazendo show, é trabalhando e não desfrutando a vista do mar em apartamento em Ipanema, enquanto o ECAD deposita a verba dos direitos autorais direto na conta corrente. Vai trabalhar vagabundo!

Só que o aspecto mais interessante dessa coisa toda é que os estilos começaram e se influenciar mutuamente. O sertanejo incorporou a batida do vanerão e aposentou a choradeira do primeiro boom causado por Leandro & Leonardo e Zezé di Camargo & Luciano. Os pioneiros foram Bruno & Marrone. Reparem, Chitãozinho & Chororó nunca foram muito inovadores, apenas seguiam a maré.

O vanerão, que ficou anos e anos engessado, mantido em cativeiro dentro dos CTGs (Centros de Tradição Gaúcha) chupinhou a batida do axé e do forró e modernizou-se, de modo a conquistar o público jovem, que já não suportava mais Gaúcho da Fronteira e Oswaldir & Carlos Magão. Tchê Garotos e o Grupo Tradição lotam estádios em suas turnês.

O forró, desde a inovação estética e formal que foi o Mastruz com Leite nos primórdios dos anos 90, sempre foi afeito a antropofagias diversas, por vezes as mais sem noção. Os caras são capazes de adaptar qualquer música ao ritmo do forró. Na época do frissom do filme "Tropa de Elite", até o A-ra-pa-pá eles conseguiram. E foram os Aviões do Forró que mais uma vez inovaram o estilo, com o minimalismo e a, por que não dizer? libertinagem do Pancadão carioca.

E a Banda Calypso, que eu considero a grande banda brasileira da década, influenciou todo mundo, principalmente com seu modus operandi: produção totalmente independente e vistas grossas à pirataria. Muito mais do que o anarco-capitalista Eike Batista, se tem um brasileiro que merece estar rico, este cidadão chama-se Chimbinha e neste momento está escolhendo as músicas de sua banda que estarão no playlist da próxima versão do Guitar Hero.

Desnecessário dizer que com toda essa mistura houve um salto de qualidade no som de todo mundo. A festa é geral, tá todo mundo feliz pacas. Justamente por não pertencerem a Zelite Cultural, não ocorreram brigas de ego e nem ataques de ciumeira de parte alguma. Eu arrisco de dizer que estamos na eminência de uma grande revolução na música brasileira. Um amálgama sonoro com potencial planetário. Muito mais que aquela porcaria fabricada em laboratório chamada Lambada.

O mais irônico nisso tudo é que a enviada especial da Zelite, aquela imbecil da Regina Cazé, só fez foi atrasar essa revolução em alguns anos em seus programas em que não fazia outra coisa além de estereotipar pessoas como este que vos escreve, pobre da periferia.

E a MPB como a conhecíamos? Ah essa daí, no dia em que a MTV propôr um Estúdio Coca-Cola reunindo Latino e Caetano Veloso, aí sim deposito 5mg de esperança em sua ressurreição.

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Friday, March 06, 2009

Get Your Head Out of the Dark Clouds

por Valter A. Rodrigues

- Este texto surgiu-me em novembro de 1996, após assistir à peça Drácula e outros Vampiros, de Antunes Filho (montagem pelo CPT, Sesc-Consolação, São Paulo). No dia seguinte à apresentação, encontrei-me com o polêmico diretor e conversamos durante horas sobre seu trabalho de formação de atores, que visa, sobretudo, formar seres humanos integrais, plenos em sua expressividade. No decorrer dos anos, voltei várias vezes a este texto, fiz pequenas alterações e aproximações a Espinosa, Sade, Nietzsche, Deleuze, até chegar à forma atual.


Parte 1: DA VÍTIMA E SEU SENHOR …ou senhores

Vítimas não falam. Não é que lhes falte a voz: sua fala não se efetiva senão numa débil demanda ao senhor. Demanda que é sempre de reconhecimento, que é sempre um frágil pedido de amor.

Pois vítimas não amam.

Falta-lhes a potência de fazerem-se amantes, falta-lhes o movimento, a expressividade que transmitiria ao outro um corpo que se vitaliza ao se “apresentar”.

Por não poderem dar materialidade à sua expressão, esperam do outro, suposto seu senhor, essa materialidade. É então desde o corpo do outro que buscam, passiva e demandantemente, sua via. Daí permanecerem em seu desejo de ser amadas, buscando figurar a si mesmas como objeto desse desejo que sempre lhes falta, que sempre lhes escapa.

Quando falam, sempre entre iguais, isto é, sempre entre outras vítimas, jamais perante o senhor, sua fala busca nomear isso que lhes falta, e as estratégias que permitiriam, finalmente, sua conquista de um contorno.

Entre si, chegam a reconhecer-se fortes, uma força que inevitavelmente fracassa ao se encontrarem em uma nova “presentação” ao senhor, com seu suposto fortalecimento antecipado. O que parecia sólido se desfaz, por mais pensados tenham sido os gestos, por mais medidas as palavras. Tropeçam em si mesmas, fazem de si mesmas sua própria armadilha, a inevitável armadilha de todo aquele que, em sua impotência, só demanda.


Não potencializando seu desejo, a vítima é sempre capturada em uma sedução, da qual sua demanda é suporte. O que a faz capturável é uma esperança e uma promessa: a de transmissão, pelo outro, de uma potência, o que jamais se realiza, salvo como efêmero, salvo como ilusão, salvo como alegria fugaz.


Trata-se, no entanto, menos de uma recusa ou de uma falha daquele que é demandado (embora isso possa também acontecer), e mais de uma impossibilidade da vítima. Referida ao senhor, e só a ele, a vítima compõe seus gestos e suas palavras a partir de um sistema de equivalências das quais só pode reconhecer efeitos, jamais causas.


Obedece, mas não serve.


E o que supõe ser ação é, em toda sua extensão, pura resposta previsível, pura reação.

Por não possuir os códigos, os assimila, assim, por espelhamento, por estereotipia, sendo sempre em um exterior que irá buscar, nos códigos a que recorre, sua própria eficácia. A especularidade é sua sina. E ali onde ela pensa ter realizado uma conquista, o que encontra é sempre uma anterioridade, uma assimilação, a evidência de uma inocente artimanha destinada a fracassar.


O senhor, suposto portador do código, só pode divertir-se e, pacientemente, demonstrar, com sua ação, a ineficácia da estratégia, que irá reverter a seu favor, devolvendo a vítima à sua própria condição. O fracasso da vítima é, assim, sempre a Prevalência (e em alguns casos, também a exasperação) do senhor. É sempre ela que “o confirma” na posição da qual supunha poder deslocá-lo, e o exige enquanto tal.

O fracasso da vítima no confronto direto com o senhor produz para este seu regojizo; [também algumas vezes desconfortável, amargo regojizo]. Assim, mesmo quando não deseja ameaçar, o senhor simula sua presença como uma ameaça, exatamente o que a vítima deseja. É assim que o senhor dispensa seu amor: jogando o jogo da vítima e fazendo-a jogar o seu jogo. Nesse jogo o senhor só faz fortalecer-se, jogando sua vítima no remoinho das repetições que a cristalizam em sua posição e garantem-lhe sua discursividade reiterativa.

É essa discursividade, que lhe escapa – ela jamais fala, é antes falada –, que a leva a supor-se conquistando um conhecimento que a retiraria para uma outra posição: a de senhor. Mas essa posição, efetivamente, ela não a deseja, por supor que perderia a única terra em que pode representar-se enquanto sendo.


Ser vítima é seu destino.

Se não há saída para a vítima, senão sua própria reiteração enquanto vítima, até a morte, essa não-saída resulta, entretanto, de um Duplo Equívoco:


Amarrada definitivamente à figura do senhor, todo seu projeto e seu movimento apontam para um porvir: um dever-ser, um vir-a-ser que só pode figurar-se como sua mais cara utopia: - tornar-se, um dia, o senhor. É por projetar-se para um futuro impossível e irrealizável que ela se sujeita.

Faz, enfim, a única coisa que aprendeu a ser, “não se apreendendo” em seus próprios devires. Alheia ao acontecimento, não reconhece em si os próprios gestos que espera que o outro reconheça. Mais: não reconhece do outro os gestos, senão enquanto sujeitadores dos seus. Assim, aspira a uma soberania, sem fazer de si mesma um corpo-língua soberano.


Aparentemente está voltada para o exterior, mas não o faz numa conexão com esse exterior, mas tão-somente enquanto certeza antecipada daquilo que “lhe vem” do

exterior. É no medo, é no horror – e na atração – a isso que pode tomá-la, que ela “se dá” forma. Este é o gozo da vítima.


Na fragilidade de quem demanda, a vítima, portanto, continuamente supõe um senhor. Mas exatamente por não reconhecer senão

suas formas de captura, o que se indiferencia para ela é o próprio senhor.

No extremo, o senhor, para a vítima, é, enquanto possibilidade, todo e qualquer outro.

E quem, afinal, é o senhor? Com certeza, não é um sujeito, um sujeito específico. Não se trata, para reconhecermos um senhor, de buscarmos aquele que detém o poder.

O verdadeiro senhor, o senhor real e efetivo, seria aquele que recusa e ao mesmo tempo joga ludicamente com o poder, não o que se faz ávido ou escravo dele, pois

o senhor escravo do próprio poder é, também, uma vítima.

O verdadeiro senhor, para ser senhor, deve ser livre. Se ele precisa do poder que lhe é externo, que lhe vem do reconhecimento que a vítima faz dele, precisará sempre da vítima para confirmar-se, e acaba se tornando escravo do que comanda.

Um mundo sem vítimas… seria sua derrocada.


II. DA VÍTIMA E SEU VAMPIRO

Por ter se tornado imprescindível à existência da vítima, a figura do senhor é uma construção da própria vítima. Talvez esteja fundada aí sua representação vampírica, como aquele que está para além da morte, que emerge da escuridão e carrega consigo o mal. Longe de ser o maior terror, é esse mal seu maior pólo de atração. Destruidor, em primeiro lugar, possibilidade de ultrapassagem dos limites estreitos da vítima, em segundo, ele é figurado como a mais temida e a mais desejada de todas as forças.

O vampiro é a maneira como a vítima representa sua possibilidade de liberação, sua possibilidade de consciência, sua paixão de tornar-se outro. Mas, como toda paixão, ela não lhe é consciente. Emerge de um fundo que a excede, daí a força da sedução que a captura.Representação romântica do século XIX (resgatada de arquétipos anteriores, transculturais), quando o desejo foi poderosamente submergido sob a ordem disciplinar do universo da razão masculina, em particular o desejo do outro sexo – que é sempre a mulher – a figura do Vampiro foi convocada a responder ao apelo da feminidade negada, tanto no homem como na mulher, como aquele que invade, que se apropria, que destrói ou que transforma sua vítima em seu semelhante, por assimilação da vítima a ele. Transgressor, fazedor da própria lei, o Vampiro abre a possibilidade, no imaginário da vítima, de escapar à lei do desejo que a conforma. Tornar-se também fazedora da própria lei, eis o projeto da vítima, seu sonho, sua utopia. Sua perversão.

De uma demanda de amor à própria afirmação de si como amante, pode a vítima realizar esse passe?

Ora, se a vítima não ama, se não tem a potência de amar, poderia ela construir para si um senhor capaz de amá-la? Como poderia, o que não ama, conceber um amante para si? O que a vítima pode conceber, em sua posição de vítima, é aquele que irá se “apropriar dela”, de sua vida, seduzindo-a, “não” o que irá amá-la. E, por essa limitação, ali onde ela sonha sua Liberdade, acaba por eleger, no outro, seu Tirano. Protegendo-se de se reconhecer enquanto desejante, canta a “glória” de seu suposto libertador, delegando a ele seu sentido, sua ação, que só seriam efetivos se lhe fossem próprios.

Eis o risco de todas as revoluções, individuais ou coletivas, postas no porvir e nas imagens ideais de poder e potência de um líder: a emergência de microfascismos. A cristalização da vítima, o aprisionamento do imaginário e não sua liberação.

O senhor sonhado pela vítima não é, assim, aquele que a afeta e a contamina com sua potência. Ele está, antes, contaminado dela, de suademanda, de sua impossibilidade. Como pensá-lo, então, senão como Tirano, senão como “modelizado” pelos referentes que a vítima retira do mundo como ela o vê [o mundo]?

Por isso, um mundo aderido às figuras e estratos de poder a que os sujeitos devem aceder – e neles permanecer – para realizarem sua condição de potência é um mundo onde só há vítimas, pois aquele que ocupa o lugar do poder, o de senhor, está permanentemente ameaçado de ter revertida sua posição, perdendo sua potência de ação. Daí sua aderência ao que pode significá-lo. E a aderência da vítima ao que lhe permite reconhecê-lo. Essa é a ameaça totalitária dos desejos de ultrapassagem e de superação do si-mesmo que concebem um pólo de convergência/referência “fora de si” para sua realização.

Seria ingênuo, entretanto, conceber um mundo “sem” vítimas, logo, “sem” senhores?

Ou um outro, em que “todos” seriam senhores?

Uma comunidade, enfim, em que todos seriam livres? Um mundo de Seres Humanos, de homens integrais?

Esse mundo, reiteram as razões e as evidências do mundo, é utópico.

Mas é necessário AFIRMAR , Sempre e Sempre, essa utopia como Virtualidade, não do amanhã, mas do Agora, pois é nela que afirmamos nossa potência e encontramos o motor de nossas ações. Paradoxal, talvez, desejante do impossível, por que não?

A verdadeira democracia, um coletivo de múltiplos, afinal, é também uma virtualidade pela qual e para a qual somos convocados a trabalhar (e não a lutar por).

Jamais um porvir (daí a inutilidade da luta), SEMPRE um devir (daí o trabalho permanente por sua efetividade).

Um mundo de senhores, um mundo de iguais, cada um em sua diferença e com a própria potência como seu único poder, para ser concebido em sua virtualidade, … exige um outro olhar, uma outra Positividade, de forma que a apreensão das relações não seja dada só por oposição ou por complementaridade ou disjunção (senhor/escravo,ativo/passivo, masculino/feminino, forte/fraco, escuro/luminoso,bem/mal…), por composição unitária, mas principalemente por Simetria, por Mutação, por Processualidade, por Diversidade, por Diferença, por Multiplicidade, por Conectividade.

Uma Revolução dos Espíritos, cujo motor ético exige, por se significar pelo olhar, uma nova assunção estética. Um novo coletivo, o da multidão.


III. DA ARTE COMO DESTRUIÇÃO DA VÍTIMA

Dos modos expressivos do contemporâneo, a arte é a que melhor consegue transformar em positividade o discurso da vítima.

Daí, talvez, o poder de atração que ela exerce para aqueles que, em sua precariedade perante os poderes, não encontram lugar para sua voz.

A essa voz sem lugar, desterritorializada, a arte da língua. Uma língua que, em relação aos poderes, está em posição continuada de extraterritorialidade.

O poder, enquanto garantidor não de uma diferença, mas de uma desigualdade, é sempre conservador de si mesmo, jamais criador de um campo novo. Contrariamente ao que poderíamos supor, o poder não cria língua. Toma para si uma língua já dada, fazendo dela seu universal, pois, por sua condição de “instituído”, ele jamais poderá ser “instituinte” sem o risco de dissolver-se enquanto poder. Assim, onde algo pode ser reconhecido como instituído, manifesta-se o poder em seu caráter conservador.

Daí o fracasso das ideologias em seus esforços de criar mundo, fazendo fracassar junto as utopias nelas e por elas sustentadas.

A arte, ao criar formas de apresentação e expressão do mundo, abre, com sua permanente reinvenção estética, as possibilidades de o imaginário exercer-se, significar-se, reconhecer-se, criar mundo.

Daí que, consistentemente, ela invista a “destruição da vítima” no homem-artista (que não é só o criador, mas também o que se coloca perante a obra em afetação com seus fluxos, suas linhas, seus campos abertos à imaginação criadora, ao próprio devir de uma subjetividade-artista). Como nos indica Deleuze, uma continuada guerra de guerrilha, não contra os poderes que nos são externos (contra eles o artista é impotente no confronto, embora possa ser lúdico nas negociações), mas… contra os poderes em SI MESMO.

fonte: anoitan

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