de RASMUS FLEISCHER
Em que medida é relevante afirmar que somos “a favor” ou contra o copyright? Tanto a estabilização como a abolição do copyright parecem estar fora de alcance. Tudo o que nos é dado a ver é uma linha de montagem aparentemente interminável de novas extensões à lei que estão a ser actualmente propostas e implementadas. A proposta mais recente é “o Acordo de Comércio Anti-Contrafacção” (ACTA) [1], agendado para discussão no encontro do G8 no próximo mês em Tóquio, que inclui uma cláusula conhecida como “a arma para acabar com o Pirate Bay” que poderá obrigar os países a criminalizarem os serviços que possam facilitar infracções ao copyright, mesmo se estes não tenham fins comerciais. Este é apenas um exemplo do modo como o copyright está-se a transformar em algo qualitativamente diferente do que foi em séculos anteriores.
Uma versão muito resumida da história do copyright poderia assemelhar-se a algo como isto: textos (1800), obras (1900), ferramentas (2000). Inicialmente, este direito foi concebido para regular a utilização de uma única máquina: a imprensa. Como tal, referia-se apenas à reprodução de textos e material impresso, sem interferir com os seus usos subsequentes. Contudo, por volta de 1900 o copyright foi drasticamente ampliado de forma a abranger obras, independentemente de qualquer medium específico. Isto abriu espaço para as organizações de gestão colectiva de direitos. Sob a sua direcção, desenvolveram-se regras de copyright extremamente específicas tendo em conta cada novo medium: cinema, gramofone, rádio e por aí fora. Esta diferenciação foi posta em causa com o surgimento da Internet e desde o ano 2000 que o copyright tem sido empurrado num novo sentido, passando a regular o acesso às ferramentas de uma forma muito mais arbitrária do que alguém poderia ter sequer imaginado na era pré-digital.
Esta alteração deriva do facto de vários media distintos serem actualmente simulados por um único medium, a Internet, e o copyright parece ser simplesmente incapaz de se adaptar a isto. Pensem na radiodifusão e nas lojas de discos, quando em tempos eram coisas completamente diferentes. Os seus equivalentes online são conhecidos por “streaming” e “downloading“, respectivamente, mas esta distinção acaba por ser artificial uma vez que a mesma transferência de dados ocorre em ambas as situações. A única diferença essencial reside no modo como o software se encontra configurado no receptor final. Se o software guarda a música como um ficheiro para posterior utilização, dá-se a designação de “download.” Se o software envia imediatamente a música para os altifalantes, dá-se o nome de “streaming.”
Contudo, o receptor pode sempre optar por transformar o stream num ficheiro digital. Trata-se de um processo simples e legal, não muito diferente do que gravar a música que passa na rádio para uma cassete. O que hoje em dia tanto atemoriza a indústria discográfica é a possibilidade dos utilizadores “identificarem e separarem automaticamente faixas individuais emitidas por transmissões digitais e guardá-las para serem mais tarde reproduzidas na ordem que quiser.” [2] Por outras palavras, elas receiam que a distinção entre streaming e downloading seja exposta como uma grande farsa.
Por exemplo, a empresa sueca Chilirec fornece um serviço online gratuito em franco crescimento que ajuda os utilizadores a gravarem streams de áudio digital.[3] Depois de escolhermos entre centenas de estações de rádio, teremos rapidamente acesso a milhares de ficheiros MP3 a partir de um repositório online, elegantemente organizado e correctamente etiquetado, disponível para download. O seu interface e funcionalidade poderiam rapidamente confundir-se com uma aplicação peer-to-peer como o Limewire. Basta ligar-nos para receber os nossos MP3s grátis, sem que ninguém pague um cêntimo que seja a qualquer detentor de direitos. E no entanto, é completamente legal, dado que a Chilirec apenas se limita a automatizar um processo que qualquer um poderá realizar manualmente.
Dividir uma gravação de uma emissão de rádio em faixas individuais e introduzir o título correcto de cada faixa é fácil mas leva muito tempo. A comunidade de código-fonte aberto está constantemente a surgir com ferramentas grátis que simplificam esse processo, como um programa chamado The Last Ripper que pode transformar qualquer serviço de streaming a pedido como o Last.fm numa biblioteca de ficheiros MP3.
Os representantes dos interesses da indústria discográfica estão com medo e recentemente eles passaram a pressionar os governos no sentido de estes criminalizarem essas práticas. Foi sob sua instrução que o denominado PERFORM Act (”Platform Equality and Remedies for Rights Holders in Music Act“) foi introduzido no Senado dos Estados Unidos no ano passado. [4] A lei proposta obrigaria todas as estações de rádio online a encriptarem a transmissão de informação relativa aos ficheiros, como o título da faixa. Contudo, qualquer dado passível de ser visualizado através do ecrã poderia ser à mesma obtido através de software especial, não obstante a encriptação, pelo que seria bastante fácil contornar essas restrições. Daí que o PERFORM Act inclua uma cláusula que proíbe a distribuir desta categoria de software.
Contudo, as pessoas dotadas de alguns conhecimentos de programação não irão necessitar muito mais do que combinar algumas bibliotecas de código facilmente acessíveis e perfeitamente legais em si mesmas para compilar a sua própria ferramenta de gravação de streams capaz de contornar o PERFORM Act. De modo a que leis como esta sejam eficazes, será também necessário censurar a troca de conhecimentos que possam potencialmente servir para programar software ilegal. O círculo de proibições pode ser ainda mais vasto: As tecnologias de impressão digital acústica, que em si não violam em nada o copyright mas que podem ser usadas para a mesma identificação de faixas individuais que as editoras tanto receiam, também devem ser provavelmente bloqueadas.
Este efeito dominó capta a essência do maximalismo do copyright: cada lei obsoleta faz com que surga um apelo em favor de pelo menos uma nova lei ainda mais radical do que a anterior. No século XXI, o copyright tende a preocupar-se menos com casos concretos de infracção e mais com a criminalização de toda uma série de tecnologias devido aos seus potenciais usos. Esta evolução limita a liberdade de escolha que as licenças Creative Commons se destinam a concretizar. Do mesmo modo, ela também acabará por refrear gravemente a inovação, uma vez que o estatuto legal das novas tecnologias será sempre incerto segundo os termos de leis ainda mais agressivas.
As agências de combate à pirataria estão hoje em dia a atacar severamente diferentes tipos de motores de busca, apenas porque eles disponibilizam ligações para ficheiros que poderão estar protegidos pelo copyright. Isto inclui o caso bizarro contra o tracker sueco de BitTorrent Pirate Bay, como os processos recentes conta o Yahoo! China e o Baidu. Apenas o Google permanece consideravelmente intocável, apesar de actuar na mesma zona cinzenta do copyright. Por exemplo, o modelo de negócio do Google Books consiste em disponibilizar milhões de páginas de livros que se encontram ainda abrangidos pelo copyright bem como os que já caíram no domínio público no âmbito de um plano de negócio assente na publicidade.
Zonas cinzentas como estas são omnipresentes no copyright do século XXI. Uma das razões para esta evolução reside no estatuto actual incerto da própria ideia de copiar. Contrastem o mundo de hoje com a época dourada do copyright, que a traços largos durou entre 1800 e 1950. Nesse tempo, era fácil fazer cumprir o copyright. O acto de ler um livro encontrava-se bastante distanciado do acto de imprimi-lo. A distinção entre máquinas de impressão e gramofones era um dado certo e seguro. Desde então, as coisas mudaram.
Quando em 1944 as tropas americanas libertaram a cidade de Luxemburgo, eles encontraram um objecto peculiar: uma máquina capaz de gravar som em fitas magnéticas. Pouco tempo depois da guerra, esta invenção militar germânica começou a surgir em casas privadas. Os gravadores de cassetes integravam num único dispositivo a capacidade de audição e reprodução, embora sob a forma de funções autónomas. Com a tecnologia digital, isso deixou de ser assim. Usar informação digital nos dias de hoje significa copiá-la.
Os computadores são máquinas de copiar. Eles não se interessam com o facto da distância física entre o original e a cópia é medida em micrómetros ou em milhas; ambas funcionam igualmente bem para eles. O copyright, por seu lado, precisa de traçar de alguma forma uma linha entre a utilização e a distribuição. Isso significa impor uma grelha imaginária por cima da miríade caótica de nós de rede, delinear conjuntos de dispositivos que podem ser atribuídos a indivíduos ou agregados domésticos.
O que quer que acontece dentro desse conjunto é definido como uso privado, ao passo que qualquer transgressão dessas fronteiras é potencialmente criminosa. Mas o que poderá significar esta divisão rígida entre privado e público para alguém com 400 “amigos” no Facebook?
Outro ponto importante a ter em conta é que o âmbito do digital é mais vasto do que o do online. De acordo com um estudo recente, 95 por cento dos jovens britânicos já partilharam ficheiros copiados de CDs, clientes de instant messaging, telemóveis, sticks de USB, email e discos rígidos portáteis. [5]
Tais práticas constituem a “darknet“, um termo popularizado por quatro investigadores afiliados à Microsoft num artigo brilhante de 2002.[6] A sua tese é muito simples: as pessoas que têm informação e querem partilhá-la entre si acabarão sempre por fazê-lo, através da formação de redes espontâneas que poderão ser grandes ou pequenas, online ou offline. Ao estarem constantemente interligados, eles podem fazer com que o material mais popular esteja constantemente disponível. Quaisquer tentativas no intuito de restringir a infra-estrutura aberta de partilha de ficheiros irão apenas empurrar a partilha de ficheiros para redes mais pequenas e sombrias.
Uma das primeiras darknets foi designada de “sneakernet“, referindo-se à prática de partilhar videocassetes ou disquetes com amigos. Mas a sneakernet não deve ser encarada como uma tecnologia do passado. A capacidade dos dispositivos de alojamento portátil de dados está a aumentar exponencialmente, a um ritmo muito mais acelerado do que a largura de banda da Internet, segundo um princípio conhecido por “Lei de Kryder.” [7] Ontem, a informação disponível nos nossos bolsos era medida em megabytes, hoje já são gigabytes, amanhã serão terabytes e daqui a uns anos serão provavelmente petabytes (uma quantidade extraordinária de informação). Dentro de 10 a 15 anos, um leitor multimédia barato capaz de caber num bolso será provavelmente capaz de guardar toda a música registada em disco jamais editada - imediatamente disponível para ser copiada para o dispositivo de outra pessoa.
Por outras palavras: Caso seja necessário, voltaremos à era da sneakernet. “Penso que isto é uma ‘carta fora do baralho’ que a maioria das pessoas na indústria da música não estão a vislumbrar de todo,” escreve Daniel Johansson, um investigador sueco em partilha de ficheiros. “Quando os fãs de música poderão dizer, ‘ tenho toda a música que vai de 1950 a 2010, queres uma cópia?’ - que tipo de modelos de negócio serão viáveis nessa realidade?” [8]
Actualmente, já temos acesso a mais filmes, música, textos e imagens que alguma vez poderemos incorporar nas nossas vidas. Abandonar este paradigma de abundância para regressar ao velho paradigma da escassez não constitui uma alternativa. Acrescentar mais “conteúdos” não irá produzir qualquer valor cultural ou económico. O que é valioso consiste em disponibilizar um contexto onde as pessoas se possam unir de forma a gerar um sentido dessa abundância.
O mundo digital coloca questões cujas respostas não podem permanecer na esfera do digital. Um dos principais desafios está em relacionar o digital com aquilo que não é digital: tempo, espaço, relações humanas e por aí fora. Kevin Kelly, o primeiro editor executivo da revista Wired colocou bem a questão ao afirmar que quando as cópias são superabundantes, elas deixam de ter valor, ao passo que as coisas que não podem ser copiadas tornam-se escassas e valiosas. O que no fim de contas importa são “valores que não podem ser copiados”, qualidades que são “melhores que grátis.” [9]
A explosão da partilha de ficheiros que teve início por volta do ano 2000 marcou não apenas o início de uma tendência de descida das vendas de discos mas também de um crescimento drástico da despesa com experiências de música ao vivo. Há apenas dez anos atrás, a música ao vivo era amplamente considerada como uma mera forma de promover os discos. Hoje, parece que é precisamente o oposto.
A música está longe de ser um exemplo único que prova como as coisas mudaram. Kelly refere como os escritores dependem cada vez mais do dinheiro que ganham com a sua participação física, em eventos, promovida pelos seus livros que poderão estar muito provavelmente disponíveis de graça. A indústria de jogos de computador compreendeu de que forma se pode ganhar muito dinheiro não através da comercialização de software, mas mediante a venda do acesso a mundos online.
As empresas que adoptaram a velha fórmula da indústria do copyright de vender “conteúdo sem contexto” estão a enfrentar tempos difíceis. “A propriedade intelectual é o petróleo do século XXI,” foi em tempos o lema de Mark Getty, o homem de negócios que usou a fortuna da família conquistada com o petróleo para investir num dos maiores portefólios de copyright do mundo, controlando mais de 60 milhões de imagens. Antes da Getty Images ser vendida a um fundo de investimentos privado, a empresa viu a cotação das suas acções descerem a pique desde o seu valor máximo de 2004.
O fracasso da Getty Images não pode ser atribuído à pirataria, tendo antes a ver com a massificação das câmaras digitais. Os editores tendem cada vez mais a preferir imagens tiradas em cima do momento, sem ter em conta a qualidade da imagem. Controlar uma enorme base de dados de imagens em arquivo torna-se menos relevante quando os jornais querem que a fotografia produza uma sensação de presença em tempo real - uma qualidade impossível de ser copiada.
Face a estas novas realidades, as indústrias do copyright podem em alternativa partir para o ataque. Os primeiros a surgirem no campo de batalha foram os cães de guarda da indústria discográfica, a Associação da Indústria Discográfica Norte-americana (RIAA) e a sua congénere internacional, a Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI). Em conjunto, a RIAA e a IFPI estabeleceram a agenda de lobbying da indústria. No topo da sua lista de prioridades encontra-se um conjunto de leis que obriguem os “transportadores de conteúdos digitais” a intervirem no modo como os seus serviços de comunicação são empregues pelos seus utilizadores o que elas chamam de “responsabilidade dos ISPs.” [10] A ACTA poderá em breve oferecer-lhes essa legislação que, basicamente, abrange medidas de dois tipos.
Uma é simplesmente a censura da rede. Em vários países europeus a IFPI está já a levar os ISPs à barra do tribunal para obrigá-los a bloquear o acesso a motores de pesquisa como o Pirate Bay. Coloca-se então a seguinte questão: Qual deverá ser o próximo site? Esse vespeiro de violações ao copyright chamado YouTube? Provavelmente não, mas estas ameaças implícitas estão cada vez mais a ser usadas pelas indústrias do copyright na sua busca incessante para acordos de licenciamento lucrativos mas unilaterais.
Ainda mais alarmante do que isto, contudo, a própria existência de uma lista negra para a Internet irá constantemente seduzir os políticos a alargarem os usos incluídos nessa lista a todos os tipos de sites moral ou politicamente inconvenientes. O Comissário da União Europeia para a Justiça Franco Frattini está já a tentar censurar a informação online sobre o fabrico de bombas. [11] No entanto, a censura pode ser contornada, como ficou demonstrado na Dinamarca, onde um número maior de pessoas passou a usar o Pirate Bay depois da implementação de um bloqueio ordenado por um tribunal.
Em segundo lugar, o grupo de pressão contra a pirataria quer obter a autorização para obrigar os ISPs a cortarem o acesso aos utilizadores e a ceder-lhes as identidades dos seus assinantes sempre que o desejarem. Infelizmente, as críticas tecidas a este tipo de medidas limitaram-se até agora a questões relativas á violação da privacidade. Embora a privacidade seja um motivo de receio válido, existem outras razões para desconfiar desta medida.
Antes de tudo, convém lembrar que a Internet não é uma rede de pessoas mas de computadores. Qualquer nó na rede não constitui necessariamente um ponto terminal mas uma potencial porta que dá acesso a uma sub-rede. É habitual que empresas e bairros instalem uma ligação de fibra óptica e a partilhem através de um router. O administrador da rede local é o único que pode fazer remontar determinadas actividades online a um utilizador em concreto. Por outras palavras, o anonimato irá permanecer uma possibilidade.
Contudo, em nome da responsabilidade dos ISPs, virtualmente quase todo o utilizador da Internet poderá ser chamado à colação. Nas discussões a respeito da responsabilidade dos ISPs, é crucial lembrar-nos de que os grandes operadores de telecomunicações estão longe de serem os únicos “operadores de redes e serviços de comunicações electrónicas.” Esta é a definição concreta de um ISP no círculo interno da burocracia da União Europeia mas à luz desta definição nós também poderemos ser um ISP. A lei Digital Millennium Copyright Act dos Estados Unidos é igualmente vaga: ela define um “fornecedor de serviço” como sendo um “fornecedor de serviços online ou de acesso a redes, ou o operador das instalações necessárias para tal,” o que poderá levar muitos a especularem se bibliotecas, empregadores ou indivíduos privados proprietários de routers podem também ser considerados ISPs.
Tendo em conta uma definição tão abrangente, qualquer empresa ou pessoa que partilhe uma ligação à rede, bem como quem quer que aloje um blog ou um fórum online poderia, em nome da “responsabilidade dos ISPs”, ser obrigado a registar as identidades dos utilizadores e a entregá-las às entidades responsáveis por fazer cumprir o copyright sempre que lhes fosse solicitado. O possível leque de abusos é enorme. Quaisquer tentativas no sentido de salvar um sistema já de si obsoleto apenas irão conduzir a uma sequência ainda mais absurda de leis subsequentes.
Enquanto isso e como consequência do ataque aos infractores em pequena escala do copyright, as darknets irão proliferar e a procura por novas técnicas de anonimato irá permanecer elevada. Mas os que mais tentarão tirar partido dessa situação serão os verdadeiros criminosos, incluindo os terroristas, ao passo que a Internet legítima poderá fragmentar-se e perder o seu carácter libertário e aberto.
A aplicação do copyright enfraquece o cumprimento da justiça em geral. E é dispendiosa. O tratado ACTA proposto irá criar legislação internacional no sentido de transformar os guardas das fronteiras em polícias do copyright encarregados de revistarem computadores portáteis, iPods e outros dispositivos em busca de conteúdos potencialmente ilegais e dotados de autoridade para confiscar e destruir equipamento sem que tenham sequer de obter uma queixa de um detentor de direitos.
Não deixa de ser característico da desonestidade patente no copyright que a ACTA tenha sido promovida como um tratado destinado a defender as pessoas do perigo de medicamentos falsos, o que tem muito pouco a ver com questões como a “responsalidade dos ISPs.” Apesar das patentes, marcas registadas e copyright serem bastante diferentes entre si em vários aspectos, o grupo de pressão da indústria do copyright prefere apresentar as suas medidas draconianas como uma questão de “propriedade intelectual” em geral.
A verdadeira disputa, mais uma vez, não é entre os proponentes e os oponentes do copyright como um todo. É entre os crentes e os não crentes. Quem acredita no copyright continua a sonhar com a criação de uma simulação digital de uma economia dos direitos de autor do século XX, baseada na escassez e com limites bem nítidos entre radiodifusão e vendas unitárias. Eu não acredito que essa estabilização irá alguma vez ocorrer, mas receio que esta visão de uma utopia do copyright esteja a desencadear uma escalada de leis que ameaçam entrar fora de controlo e prejudicar as liberdades civis. Aceitar uma atitude laissez-faire em relação ao desenvolvimento de software e à infra-estrutura de comunicação pode evitar essa escalada.
A partilha não autorizada de ficheiros irá prevalecer nas darknets, online ou offline. Por outro lado, certas actividades não digitais, como a edição de livros, irão continuar a funcionar relativamente bem de acordo com os termos do copyright clássico concebido a pensar na imprensa escrita. Contudo, outros sectores como o software e a música caracterizam-se por uma competição complexa entre diferentes modelos, onde alguns ganham dinheiro com a venda de unidades copiáveis, ao passo que outros lucram com o fornecimento de serviços impossíveis de serem copiados. O mais provável é que tenhamos que viver neste cenário marcado por zonas cinzentas durante bastante tempo, para o mal e para o bem.
As práticas criativas, não obstante algumas excepções, prosperam onde a abundância digital está ligada a qualidades escassas como o tempo e o espaço. Mas nunca iremos conseguir arranjar um modelo de negócio universal para um mundo sem copyright. A questão mais urgente diz respeito ao preço que teremos que pagar por prolongar o fantasma de um copyright universal.
Notas
[1] IP Justice: Anti-Counterfeiting Trade Agreement (ACTA).
[2] IFPI: “Digital Music Report 2007?, p. 20.
[3] http://www.chilirec.com/
[4] http://feinstein.senate.gov/06releases/r-dig-music.htm
[5] Katie Allen: “Home copying - burnt into teenage psyche.” The Guardian, April 7, 2008.
[6] Peter Biddle, Paul England, Marcus Peinado und Bryan Willman: “The Darknet and the Future of Content Distribution.”
[7] Chip Walter, “Kryder’s Law.” Scientific American, July, 2005.
[8] Daniel Johansson: “The Future of Private Copying.” Digital Renaissance, March 27th, 2008.
[9] Kevin Kelly, “Better than free.”
[10] IFPI: “Digital Music Report 2008.”
[11] “Website bomb-making lessons to be outlawed across Europe” Times online, July 4, 2007.
Autor deste texto: Ramus Fleischer
Estudante de doutoramento em história, ele é o autor do blog Copyriot e um dos responsáveis pelo Piratbyrån ou “Gabinete de Pirataria”, um think tank de oposição ao direito de autor e cuja história se confunde com o Pirate Bay.
Tradutor para o português: Miguel Caetano
Publicado originalmente no blog português Remixtures.
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Monday, July 07, 2008
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